sábado, 28 de dezembro de 2013

QUE FIM É APENAS O FIM?

Livraria atingida por ataque aéreo - Londres, 1940. 

Todo mundo tem algo que considera importante na vida. Um conjunto de pessoas, valores, noções que lhe são caras e que são o motivo de continuar. E no meio dessas coisas que se pode tocar e das outras que preenchem a alma, há aquilo de natureza indefinível.
Nem é matéria, nem energia, nem pensamento. O dia segue. Tristezas e alegrias, trabalhos e lazer. Tudo passa e é sorvido na velocidade de uma refeição. Mas a coisa indefinível está lá. Se você está me lendo agora, existe uma séria possibilidade da sua ser parecida com a minha. Já que eu não posso definir, talvez possa apenas falar algo a respeito. E se você sorrir...
Quando acordar é encontrar um sol manso, como se o próprio dia dissesse bom dia. Há uma solidão que parece um brinquedo novo, o papel de presente deixando um cheiro bom de surpresa, de ânimo. E esse brinquedo é dos que você aperta um botão e se transformam em outra coisa. Talvez seja da Glaslite, quem sabe da Gulliver ou da Estrela. Que diferença faz?
Há dias que a tarde é linda. Eu tento sempre pensar que neste exato momento há alguém plenamente feliz com tudo. Fico imaginando se um dia vou chegar a conhecer essa pessoa e numa conversa casual ela vai me dizer: “No dia tal eu estava tão feliz! Foi o melhor dia da minha vida!” E aí eu digo: “Sim, eu sei. Eu estava pensando em você.” E ele ou ela diz: “Impossível, isso foi há vinte anos, a gente nem se conhecia.” E eu digo: “Você nunca conversou com estranhos?”
Mas talvez a noite seja a mãe dos livros. É quando as musas passeiam e as ninfas cantam. Quando monstros despertam e os guerreiros bebem para saírem abraçados, cantando canções engraçadas. Hoje eles conhecem carros e ônibus que trafegam por avenidas iluminadas e os embates se dão entre catedrais e nas trevas dos becos.
Manhã, tarde e noite. O tempo possui fendas por onde escoam histórias, passagens para lugares imensos. De Nárnia à Terra do Nunca. A Terra Média, Shangri-la. Metrópolis, Gothan, os Domínios dos Perpétuos. Imatheria. E em sua mente, talvez aquele que jamais se repetiu.
Por aquilo que me move me perdi e me encontrei num outro tempo. Quando aqui acordei, vi que nada mais será como antes. Em sua busca talvez você se depare com o mesmo e também se assuste. Mas talvez aprenda lição semelhante à minha. Devemos ter grandiosos desejos, mas eles jamais podem ser maiores que nós mesmos. Eles devem nos completar e não nós a eles.
Tudo acontece quando a gente fecha um olho. Tudo acontece quando a gente fecha o olho certo. Isso faz a gente conquistar o dia e engravidar a noite. Ou engravidar dela. E ver nascer a luz de outro poder, abrindo fendas no tempo, se esgueirando entre realidades, mandando mensagens e conjurando amigos. Esta foi a jornada em busca de uma voz para o inominável. Saga de transformações, nascimentos e mortes. De promessas e ações. Fim verdadeiro.
E que fim é apenas o fim?
Se você sorriu...então somos irmãos. Que a paz do Altíssimo permaneça com você.

(Quem souber o autor da foto, por favor, mande comment.;)


terça-feira, 10 de dezembro de 2013

NA BARRIGA DO PEIXE

Art by Kayamori


Reza a lenda que de tempos e tempos, Tracapus, o peixe galáctico que contém a passagem para outros universos em sua barriga, aparece neste mundo e leva consigo aqueles que possuem grandes aspirações.
Essa lenda ficou esquecida entre os mesopotâmicos, os hebreus e inúmeros outros povos antigos. Alquimistas acreditavam que quando Tracapus estava prestes a adentrar nossa realidade, aparecia décadas antes em sonhos (e pesadelos) de homens e animais, suscitando histórias, visões apocalípticas ao redor das quais charlatões, xamãs, médiuns e profetas eram construídos.
 Assim, Tracapus convoca seus aventureiros estimados ao redor do mundo. Ele os atrai para o alto mar e os engole. Depois de completada a busca, submerge e se vai para os recônditos desconhecidos onde por séculos se esconde.
Depois de acordar, o rapaz apenas sabia de tudo isso. O mesmo Jorge que sonhou com uma decisão no deserto, agora está diante do mar.
Assim como seus companheiros, jamais ouvira falar de Tracapus. Assim como todos os habitantes da cidade, não tinha ideia de onde vieram ou para onde iriam os barcos misteriosos que estava encalhados na praia há semanas. Mas seu olhar sereno aceitava o chamado de Tracapus. Era certo que os amados amigos o seguiriam, por isso a calma de seus passos.
E depois de embarcar, nada mais seria como antes. As coisas mudariam para Jorge e seus amigos. E as coisas mudariam também para Tracapus.

Até as Lendas sabem que uma mudança não vale nada se não for de dentro para fora. E que não merecem ser contadas se não forem completas.