quinta-feira, 30 de dezembro de 2010

Los Quatro Guapos



Havíamos comprado nosso primeiro videocassete naquele ano e só havia uma locadora no bairro. Então, todo sábado tínhamos de esperar e rezar para que nosso pai não bebesse para poder ir com a gente alugar filmes e isso era o máximo (pense!).

Eu me lembro daquela noite de 1993. Novembro ou dezembro, acho. Eu lia um gibi do Capitão América na calçada e estava ansioso para nosso programa de fim de semana preferido : alugar filmes na locadora. Na verdade,era o único programa possível naquela época de total dependência do dinheiro dos meus pais! No meu bairro sempre foi pobre em diversões para garotos da minha idade que gostavam de quadrinhos, ficção científica e não se misturava com aqueles outros meninos que diziam nomes feios e batiam uns nos outros.

Nesse dia, eu perturbei meu pai para que fôssemos logo, mas ele disse que só iria após o In Concert. Os in concert´s eram programas de uma rádio, não lembro qual, em que eles apresentavam, por uma hora ininterrupta, músicas de determinado artista. Como não tinha outra alternativa, sentei com meu gibi e esperei. Quando o programa começou, meu pai correu e pegou uma fita k7 para gravar. À primeira música, no auge dos meus nove anos de idade, fiquei completamente rendido.

Pra quem não lembra ou nunca viu: esta é uma fita k7.Que sausdade...

Eu já sabia que eram os Beatles, já os vira na TV antes, mas aquele era meu primeiro contato formal, a primeira vez que ouvia sua músicas na íntegra, prestando total atenção. Eu não sabia nada de inglês, mas as melodias me tomaram de completo. O som carismático, contagiante, me fazia querer mais e mais e cada música me surpreendia. Acho que eu já ouvia alguma coisa de Legião nessa época, mas não tinha para mim a importância que teria dois anos depois. Portanto, acredito que os Beatles tenham sido meu primeiro contato com o rock de verdade.


 A fita do in concert que meu pai gravou foi naturalmente usurpada por mim. Ela ficava na minha mesa, junto com meus livros e meus gibis. Eu ouvia todo santo dia. Acabei buscando outras coisas deles, mas sem as facilidades da internet, só podia mesmo era esperar por mais programas como aquele para que pudesse gravar outras músicas, o que de fato aconteceu. Em menos de três meses eu tinha umas três fita com quase todas as músicas dos Beatles até o álbum Revolver. Portanto eu só conhecia a primeira fase deles, o que aqui no Brasil se poderia chamar de época do “iê, ê, iê” (quem será que inventou essa expressão ridícula?).

A segunda porrada beatlemaníaca aconteceu no ano seguinte. Na extinta rede manchete exibiram um especial com várias apresentações e videoclips dos quatro fantásticos, com um breve histórico. Aquilo foi um choque. Foi quando me dei conta de que os caras seguiram uma evolução musical e conceitual e se tornaram influência importante na cultura pop. Foi quando tive um vislumbre da magnitude do fenômeno Beatles. Tinha uma apresentação de “Hello, Goodbye”, de “Let it Be” e de “All You Need is Love”, que me parece ter sido uma das primeiras transmissões via satélite da história. Vê-los completamente diferentes, com uma outra sonoridade, mais complexa, mais instigante e misteriosa, aquilo mudou minha visão em muitos aspectos. De certa forma me fez ver que existe um monte de coisas incríveis a se descobrir, coisas que vão muito além daquilo que nos é oferecido. Coisas que nós devemos buscar descobrir por conta própria.


 Por volta de 97, a Globo exibiu um mega-documentário chamado “Anthology”, onde toda a carreira deles era devassada minuciosamente. Foi aí que vi o quanto de genialidade existia em suas visões, o quão revolucionários foram para o rock, mas também o quão humanos, portanto falhos, eles eram. Fiquei sabendo sobre a Apple, sobre a amizade de Lennon e McCartney, sobre o que significava a frase “O sonho acabou” e sobre um monte de detalhes sobre músicas pelas quais eu sempre fui apaixonado como “Strawberry Fields”, “Peny Lane” e “Sargent Peppers”. Sobre o Maharish e a lendária apresentação no telhado da gravadora Apple conhecida como “rooftop concert”, a última apresentação ao vivo dos caras , em Londres.

O Rooftop Concert

 Em 2000 foi um documentário em vídeo narrado por Malcolm McDowell ( o Alex, de Laranja Mecânica)bem menos detalhista que o Anthology. Foi nesse filme que entendi a influência de Yoko. Embora todos atribuam uma grande parcela de culpa a ela pelo fim dos Beatles, tudo o que vi e li até agora a respeito me levam a acreditar que essa idéia é um tanto exagerada.


John e Yoko por Annie Leibovitz


Todos esses contatos com os quatro rapazes de Liverpool são agora lembrados como algo mágico. Os Beatles marcaram minha vida não só por terem sido o máximo, uma grande banda, mas por muitos outros motivos. Comecei a ouvi-los quando era criança, eles despertaram em mim um interesse musical que jamais me abandonou, mas a sua história incrível e a genialidade contida nas mensagens e na simplicidade com que falavam de coisas extremamente difíceis de discutir, tais como amor, felicidade, morte e guerra, já possuem tanta relevância histórica quanto os hieróglifos egípcios e a bomba atômica.







sexta-feira, 17 de dezembro de 2010

V DE VIOLÊNCIA



Nos dois últimos posts eu me referi a um monte de coisas que até agora estão me incomodando pra caramba e tive duas respostas nos comments, uma bem diferente da outra. Mas ambas me tocaram muito, pois partiram de pessoas que me fizeram sentir que realmente entenderam minhas aflições.

A Adorável desconhecida (rsrs) Fernanda acha que a felicidade não precisa ser fácil (como de fato não é!). Acredito que isso faça sentido na medida em que só damos valor àquilo que nos custa esforço e tempo para conquistar. E o meu querido amigo semi-presencial Don Carlos acha que a felicidade deveria sim ser fácil. Isso faz sentido na medida em que entendemos a felicidade como um direito do ser humano que deveria vir no kit de sobrevivência imediata, junto com o leite materno e o oxigênio.

Falei sobre máscaras, adaptações cruéis à realidade, lobisomens e tudo isso tem a ver com o fato de que é muito mais fácil nos entregarmos às condições impostas pela sociedade do que nos revoltarmos contra o que está contra nós, o que nos coloca na obrigação de nos tornarmos pessoas completamente diferentes do que gostaríamos. Você já pensou se você é a exata pessoa que gostaria de ser?

Como eu havia dito, reprimir nossas vontades, nossas aspirações pela verdadeira felicidade tendo de “adaptar” (detesto essa palavra, Darwin...) nossa personalidade às condições provoca uma certa dicotomia na alma, empurrando partes importantes do nosso eu para dentro de lugares obscuros da mente. Eu sempre (assim como Alan Moore...) imagino um prisioneiro dentro de uma cela esperando o momento certo de vingar-se dos seus algozes. O que não dá mesmo para imaginar é como será essa “vendeta”. Certamente dependerá de como a pessoa encara as adversidades, de como ela alimentou as aspirações do prisioneiro. Pois anteontem um cara chamado Clay Duke nos deu um exemplo de como essa libertação pode ser violenta.

Ex-presidiário, desesperado após a demissão da esposa, pegou uma arma e calmamente se dirigiu ao colégio em que ela trabalhava e invadiu uma reunião de conselho mandando todos saírem, exceto aqueles que considerava responsáveis pela demissão. Com um spray pintou na parede o famoso “V” com um círculo em referência ao misterioso personagem da graphic novel de Alan Moore, mais conhecida pelo grande público pela adaptação de 2006 para o cinema.



 
Clay disparou algumas vezes contra as pessoas, quase foi contido,levou um tiro na perna disparado por um segurança. Encurralado, matou-se. Obviamente a intenção de Clay não era a de matar ninguém. As balas que disparou contra as pessoas eram de festim, enquanto a que o matou era a única verdadeira. Clay não queria matar. Muito menos morrer. Ele morreu justamente porque queria viver. Ele viu tudo o que estamos vendo agora, percebeu que estamos fingindo agüentar o fato de que precisamos de tempo, espaço e oportunidades para crescer em paz.Ele queria crescer, coisa que a sociedade cobrou dele, mas não lhe deu chance para fazê-lo. Sei que parece sensacionalismo, mas o que vejo aqui é que o homem usou suas últimas forças para nos dar um importante alerta a respeito do lugar para onde estamos indo. Ele só explicitou o que acontece todos os dias o dia todo. A face violenta da civilização emerge a cada dia das mentes das pessoas sufocadas.

E eu achava que a revolução se daria no momento em que puséssemos as máscaras, tal como V,no filme e nos quadrinhos. Mas Clay Duke me fez ver que a coisa toda irá acontecer quando as tirarmos.



sábado, 16 de outubro de 2010

ESTADOS ALTERADOS DA MENTE



Acho que muita gente deve viver mais de uma vida. Não sei quão nocivo isso seja pra mente de alguém, nem se essas pessoas, como eu, admitem que não são o mesmo tipo de pessoas em todos os lugares. Mas falando por mim, não é nada, nada agradável.

Claro que ninguém gosta de admitir isso, mas a verdade é que nossa sociedade nos obriga a fazer isso. Há algumas semanas quando essa coisa da vida dupla começou a me incomodar de verdade eu fui a uma psicóloga. Disse a ela que me sentia dividido por que o trabalho que faço hoje não é o trabalho que quero fazer por toda a vida e que me dividir entre esse trabalho e a faculdade, ou seja, uma coisa que me machuca e outra que me agrada completamente, estava me deixando meio psico.

Eu sei que ela tinha a melhor das intenções, mas ela me disse tudo o que eu não queria ouvir. Ela veio com aquele papo de que os tempos mudaram, que o ser humano tem de se adaptar a essas mudanças rápidas e ser muito flexível. Como eu estava me sentindo muito mal, não consegui me expressar direito e acho que ela se sentiu um pouco ofendida com minha argumentação. Perguntei se essa “flexibilidade” não poderia ser confundida com hipocrisia. Afirmei categoricamente que se não, com certeza isso faria no mínimo um enorme estrago na alma. Quero dizer, tendo de mudar a cada dia para me adaptar às mudanças do ambiente, não irei c acordar uma bela manhã e não saber mais quem eu sou?

Ela, mesmo desconcertada pelo meu ataque disse que era perfeitamente possível ser esse camaleão sem se perder de si mesmo. Nós sabemos que isso não é verdade. Pelo menos não pra todas as pessoas. Não pra mim.

Não consigo dissociar essa visão de múltiplas vidas da interpretação que Stephen King fez do mito do Lobisomem em seu livro “Dança Macabra” (que não é um romance, mas uma análise do fenômeno do terror na cultura pop do século XX). Lá ele diz que o lobisomem representa o lado selvagem do homem normal e virtuoso. Esse lado reprimido nos calabouços obscuros da mente acaba um dia soltando suas amarras e vencendo a virtude, libertando-se faminto e furioso em busca de carne e vingança. Por isso não me lembro de nenhum momento de minha vida que tivesse sido tão “Jekill and Hyde” quanto este. E fico pensando no motivo pelo qual as pessoas (inclusive eu!) simplesmente aceitam essa condição.

Gostaria de acreditar que a boa psicóloga que visitei estivesse certa e, mesmo que eu fosse obrigado a ser uma pessoa durante o dia e outra de noite, pudesse sempre reconhecer meu verdadeiro eu. Talvez eu me sentisse mais seguro e confortável se eu tivesse certeza de que ela soubesse qual de seus inúmeros “eus” estava me atendendo naquele dia.



sexta-feira, 8 de outubro de 2010

V ou Alex?



O cara da foto acima foi magistral (embora mal compreendido em sua época) em sua exposição baseada no livro de Anthony Burgess. O caminho aqui é meio diferente, mas mexe com os mesmos princípios que regem o comportamento humano. Sem firulas, isto é sobre a violência. Um dia desses eu vi na tv algo sobre justiceiros atuando no Bom Jardim. Claro que não é justificável um cara se armar e passar fogo nos "bandidos" (seja lá o que isto signifique nos dias de hoje). Mas é completamente compreensível...

Tanto em Laranja Mecânica como em V de Vingança ( uma das graphic novels mais simples e incrivelmente significativas desde as inscrições rupestres) o foco é o mesmo, mas a abordagem do personagem principal é outra. Alex quer ver o caos crescer para descobrir o novo. "O que há depois do Big Bang?". Mas V já sabe o que existe depois. Ele quer a ordem depois do caos, embora seja o caos algo necessário. Para ele está tudo calculado.

Acredito que o território aqui seja o mais propício para os dois futuros se concretizarem. O que há de diferente? Nem o fato de desligarmos a tv após o jantar e fingirmos que nada aconteceu é diferente. Um dia o negócio chega na nossa porta. Pode ser na forma de um enorme pênis de porcelana esmagando seu crânio ou o governo restringindo nossas expressões justo no momento em que precisamos gritar por mais tudo, contratando os donos do caos ("una-se a eles") para assegurar nosso bem estar, maquiado em milagre governamental.

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Quando finalmente alguém descobrir onde estamos no tempo, o primeiro que porá a máscara no rosta pensará como V ou como Alex?



domingo, 12 de setembro de 2010

TODAY YOUR LOVE..TOMORROW THE WORLD!!!!!!ramones

COMO EU E MINHA AMIGA SUE BABY CAPIVARA TEMOS MUITO O QUE CONVERSAR E POUQUÍSSIMO TEMPO PARA TAL, RESOLVI VOLTAR A ESCREVER CARTAS PRA ELA. HESITEI UM POUCO EM POSTAR A QUE VOCÊ ESTÁ VENDO ABAIXO PELO TEOR "TEORIA DA CONSPIRAÇÃO". NO ENTANTO, COMO AINDA ESTOU SEM ACESSO A COMPUTADOR E FAZ TEMPO QUE NÃO POSTO NADA, LAI-TE RAI:



Sue,

Sabe o que é incrível sobre mim na frente de um computador? Eu nunca consigo lembrar daquilo que parecia mais importante fazer quando eu estava longe dele. As idéias parecem sumir, ou mais precisamente, minha atenção fica completamente ofuscada pelo enorme aglomerado de coisas inúteis (e talvez por isso muito atraentes ) que se pode fazer num computador com internet. Quero dizer, com o monte de idéias para contos e textos para postar no blog que venho tendo, eu estou é teclando com a Díli sobre o Corta Bundas e vendo os VAGAZOIDES no Youtube!

Quando eu penso sobre todas aquelas coisas sobre as quais a gente tenta conversar (pois nunca dá tempo de ir direto ao foco...) fico imaginando que o que eu espero que aconteça é uma mega mobilização intelectual envolvendo música, cinema, TV e literatura onde pessoas como você e eu, que PRECISAM dizer alguma coisa, podem realmente se expressar, pois têm meios para isso. Aí alguém nos ouvindo enquanto divagamos no banco da praça do Liceu pode se perguntar:”Mas do que é que eles estão falando?! A internet não está aí para isso?”

Aí é que está, meu bom bisbilhoteiro da conversa alheia. No nosso caso, no meu e no seu, doce Sue, o meio não é o modo pelo qual a mensagem seria transmitida. De certo modo, o meio não seria nem mesmo como a mensagem seria transmitida, mas o meio, ensaiando uma aberração nos elementos que compõem a comunicação, é o próprio receptor da mensagem. Ele está lá, assim como o veículo, o código e a própria mensagem, mas o que ocorre é que a nossa mensagem é irrelevante para ele.

Esse nosso receptor, que apesar de funcional é um safado inútil que não entende nem se interessa pelo que temos a dizer, é alguém lá dos seus quinze anos, no mínimo, que quer tudo prontinho e detestaria pensar no por que daquela mensagem existir. Ele odeia textos longos e não sabe que existem outros tipos de abordagens temáticas na música que englobam assuntos para além da choradeira melódica envernizada de arrojo que costumeiramente se convenciona denominar de EMO. Eu diria mais, a mensagem e a forma a se configurar, pelo menos na minha mente é mais especificamente direcionada às pessoas que esses receptores serão num futuro próximo.

Nós podemos fazer muita coisa com os pouquíssimos (mas pouquíssimos mesmo) recursos que temos.Mas a importância do que temos de fazer torna a coisa toda um hercúleo desafio de renovação, ou mesmo de invenção de uma nova linguagem.

O fenômeno EMO não é em si o maior desafio porque não é o foco do problema,mas sim uma conseqüência, um efeito colateral que resvalou no nosso senso de realidade, um fragmento de todos os outros maiores e mais incômodos efeitos oriundos de uma raiz mais nociva. Sabemos que a raiz do problema, muito sutill e genialmente abordada pelo Radiohead na sequência de discos “OK Computer”, “KID A” e “Amnesiac”, é um ciclo de erros e negligências relacionadas a degradação do ente humano caracterizado pela crise na instituição familiar e resultando na formação de pessoas cada vez mais superficialistas e numa sociedade imediatista, fútil e com uma temível tendência a banalizar tabus, ser manipulada e disseminar formas em conteúdo.

Em linhas gerais, o que a gente quer, claro, não sendo rigorosamente preciso quanto aos seus objetivos pessoais, é talvez mais fundamental e menos pretenso do que o trabalho do prisioneiro liberto da caverna de Platão. Não queremos mostrar a verdade àqueles que supostamente não a conhecem, até porque nós pouco conhecemos da verdade. O nosso maior objetivo, se assim posso ousadamente falar por você, é apenas fazer frente a tudo isso. Oferecer alguma resistência. Tudo bem que os jovens de hoje não vejam relação alguma entre a política podre e a desigualdade social e sejam distantes o bastante para não raciocinarem que coisas ruins acontecem o tempo todo com as pessoas em parte porque não percebemos mesmo tal relação. Tudo bem que as pessoas não consigam entender que música, cinema e TV podem ser muito mais que só entretenimento. Tudo isso tem mesmo que existir. O problema é que não há equilíbrio. Aqueles que regem esse...sistema se é que existem, eles não possuem uma força de mesma intensidade agindo na direção oposta, eles não possuem um nêmesis.

O que queremos é isso, é existir para dar equilíbrio às coisas, mas olhamos para o lado e não vemos ninguém. Volta e meia encontramos alguém com aquele brilho no olhar que inspira cumplicidade com nossos propósitos e percebemos que, em algumas atitudes eles expressão objetivos semelhantes aos nossos. Esses são os chamados “heróis infiltrados”. Gente que parece estar agindo de acordo com o sistema, mas que na verdade o está sabotando delicadamente.

Pensar em revolução, alcançando esses níveis de mudança estrutural no zeitgeist, é sem dúvida uma utopia,mais até do que uma necessidade urgente. Mas o fato é que isso é uma necessidade urgente. Só que ela não acontecerá. Não há, pelo menos ainda, um líder ou uma idéia central, contundente e motivante e não há aquilo que parece ainda mais motivante: a figura de um inimigo. Esse algoz atual talvez esteja escondido num lugar onde os seus predecessores não puderam esconder-se, onde Hitler não pôde, onde os generais da ditadura não puderam, onde o Darth Vader ou o Big Brother do livro 1984 de George Orwell não pôde. O inimigo está em todos nós. Nos bons e nos maus, sob diversas formas. Em alguns na forma de medo, em outros na forma de vergonha, em outros na forma de conformismo, em outros na forma de pretensão. Esse facínora multifacetado conseguiu no seu mimetismo a arma mais eficaz de ação.

A suposta revolução, portanto, não se dará de forma abrupta, violenta. Ela terá de ser tão sutil quanto a situação. Ela deverá ser de dentro para fora. Então nossa primeira e maior estratégia será fortalecer o interior.

A única pergunta que me resta depois disso tudo é: “Tudo o que estamos passando, nossos fracassos, nossa consciência das deficiências e necessidades, isso tudo nos está fortalecendo interiormente?”

quarta-feira, 26 de maio de 2010

terça-feira, 13 de abril de 2010

A DO VIZINHO É SEMPRE MAIS VERDE...



Ontem fui buscar minha esposa no curso à noite. Havia chovido um pouquinho, eu tinha acabado de assistir “Janela Indiscreta” do Hitchcock.

A avenida estava toda banhada de um brilho calmo e delicado. O vento estava frio e o clima dava uma impressão gostosa de que as coisas estavam rolando em câmera lenta.

Quando eu passava perto de um condomínio, percebi que no terceiro andar havia um jovem senhor deitado numa rede na sacada de seu apartamento lendo um livro. Não me lembro de ter visto muitas coisas na vida de outras pessoas que tenham me transmitido tanta paz e isso pode ter a ver com minha tremenda fixação por imagens de pessoas lendo. O fato é que aquilo me encheu de uma maravilhosa inveja.

E pensei: “Deus o abençoe, meu bom homem. Você tem a grama mais verde que vi em semanas.”

sábado, 10 de abril de 2010

EU DANÇO SOZINHO

                                   
Quando fico em casa pela manhã me sinto extremamente sozinho. Minha esposa trabalha até ás 15 horas e nesses dias de folga não consigo imaginar como alguém que planeja tanto seus momentos de lazer pode ficar tão perdido com o pouco e precioso tempo que tem pra ficar sem fazer nada de “importante”.

Quando estou atolado de trabalho e cheio de coisas da faculdade pra fazer fico só pensando nos filmes que tenho pra assistir, nas minhas revistas em quadrinhos que estão na gaveta ainda no plástico, nos livros que comprei ou que peguei na biblioteca, nas idéias para histórias de terror que eu gostaria de escrever. Mas na hora não vem nada, é como se minha mente ficasse vazia e nada disso existisse em minha vida.

Quando tento refletir sobre as causas desse estranho fenômeno concluo parcialmente que a presença da minha mulher é tão importante em casa que quando ela não está eu perco um pouco o sentido de fazer qualquer coisa (aposto que se você é uma menina que está me lendo pensou:”que bunitim...”, mas é precisamente isso, mais constatação que romantismo mesmo, embora ele exista em intensidade considerável, você ficaria surpresa, mas enfim...).

Então, acontece aquela coisa incrível de você se deixar levar pelo tédio. Nem sempre sai muito o que preste disso (meu caso) mas quando você passa a se observar, percebe que existem certos aspectos da sua própria personalidade que provavelmente jamais alguém conhecerá (e isso deve ser um daqueles mecanismos de defesa identificados por Anna Freud, sei lá...a gente esconde por puro instinto de sobrevivência). Posso citar alguns meus porque se você me conhece sabe que sou desajeitado e pagar um mico a mais ou a menos não fará diferença. Por exemplo, quando eu vou me enxugar depois do banho, sempre uso a mesma sequência. Quando estou lavando os pratos a noite, às vezes fico muito, mas muito tempo mesmo olhando pro céu (a nossa pia é no quintal, precisa ver como é difícil fazer isso quando está chovendo. Não é nada agradável). Aí fico olhando a imensidão e imagino que estou naquela estação espacial do filme “2001” do Kubrick, mas sem o computador assassino, claro.

Outra coisa que só faço sozinho é ficar olhando meus livros durante HORAS. Não sei, mas eles estarem lá é como se os escritores morassem comigo. Eu amo meus livros de paixão. Quando os observo lá arrumadinhos, minha mente voa tanto quanto ao lê-los. Fico só imaginando como era a vida do Kafka, penso que ele devia ser um cara bem desastrado e inseguro como eu, brigando consigo mesmo o tempo todo. Tenho um carinho muito grande pela figura desse cara. Aí tem aqueles mais pomposos como Goethe. O cara fez parte dos Illuminati, meu. Isso é que é ter uma vida incrível. E tome tempo eu olhando pros livros. Ficar assim, lesado com as coisas, é o que mais me caracteriza.


Mas o mais louco é esse. Geralmente, quando ficar sozinho começa a me angustiar e vejo que vou passar a manhã sem fazer nada de interessante pelo menos pra mim e a hora de ir pra faculdade já está chegando, quase sempre resolvo meu problema assim: vou na minha mesa, abro minha bolsa e pego meu pen drive. Como já estou lá mesmo, aproveito e pego uns cd´s que não ouço há tempos. Ligo o sonzinho e meto um Clash, Ramones, Sex Pistols ou mesmo uns hard tipo Hendrix ou Zeppelin. Mas tem dias que um Chuck Berry basta a manhã toda. Dependendo do grau de intimismo em que eu esteja pode rolar Smiths, The Cure ou Radiohead. Bem, não importa o que esteja rolando, eu danço sozinho mesmo. ..e canto...


Claro que é extremamente tosco, mas talvez no final das contas tudo esteja lá pra despertar ações espontâneas do corpo e o que flui naturalmente, desconcertante, cafona ou que for, é sempre o mais adequado. E é claro que existem muito mais coisas que eu só faço sozinho. Mas a grande viagem é que esse tipo de pequenos comportamentos integralmente individuais, não compartilhados até mesmo com os mais íntimos, são sinais que podem nos fazer pensar que podemos há coisas que o tempo, as circunstâncias e as pressões da vida adulta jamais irão tirar de nós.

sexta-feira, 2 de abril de 2010

DESINTEGRANDO VIZINHOS CHATOS

EXTRAÍDO DO MEU DIÁRIO ESCRITO NO DIA 21/03

Hoje resolvi dar um jeito na coisa. Como acontece todo final de semana, meus vizinhos imbecis acordam cedo. Muito cedo. Ligam o som no último volume e assim vai embora um dia inteiro de descanso.
É incrível como eles conseguem ser primitivos o bastante para não entenderem princípios tão elementares da vida em sociedade. Como por exemplo, aquele que diz que finais de semana (e especialmente domingos) são dias feitos para que pessoas que acordam cedo todos os outros dias possam dormir tranqüilos, sem ter de se preocupar com despertadores e outras coisas barulhentas e irritantes. Que é sinal de muita sensatez e decoro manter certo nível de silêncio para que essas pessoas que trabalham duro e ganham pouco, pelo menos até as dez da manhã, possam compensar o sono acumulado da semana atribulada na qual se acorda cedo e dorme tarde.
No entanto, meus vizinhos, as mais irritantes das coisas barulhentas e irritantes, ignoram esse princípio que me é tão caro (eles ignoram muitos outros também, mas esse é outro assunto). Eu nem acordo tão tarde assim no domingo, pois meu organismo já está condicionado à rotina, motivo pelo qual não consigo dormir bem após as seis da manhã. Pois é nesse momento que me levanto, abro minha janela e com um livro na mão vou tentar relaxar um pouco.
Tentar.
Mal o ponteiro marca sete da manhã e eles ligam o maldito som me obrigando a engolir aquela porcaria de brega, carimbo, sertanejo e o caralho a quatro....ughhhhhhgh, que raaaiva!!!!!!!
Bem...desculpe. Continuando. Pois hoje não foi diferente. Esperei toda a semana para ler uns trechinhos de “O Sol é Para Todos”, da Harper Lee, que tanto havia procurado em minha vida e acabei achando na segunda passada. Depois de dois minutos sentado enquanto perscrutava as páginas, a tortura explodiu como de hábito em ondas sonoras que fazem o bonequinho do Superman da minha mesa de trabalho pender de um lado para o outro.
A ansiedade chegou a níveis insuportáveis e não pude me conter. Como Michael Douglas em “Um Dia de Fúria”, resolvi hoje que ninguém vai se colocar entre mim e meus objetivos (nesse caso, o descanso) e decidi tomar a providência que havia evitado por tantos meses.
Larguei o livro sobre a mesa, fui ao quarto. Sem acordar minha esposa (como ela consegue dormir com aquele barulho ainda é um mistério da ciência!) puxei a caixa de aço que guardo embaixo da cama. Digitei o código de segurança e abri bem meu olho direito na frente do leitor de retina. Num click a caixa abriu e estava lá: O CANHÃO DESTABILIZADOR ATÔMICO. O mais temido artefato bélico secreto que veio parar em minhas mãos por meios que não posso revelar nem mesmo em meu diário, pois caso eu seja pegue pelas autoridades internacionais meus fornecedores não devem ser identificados.
Retirei cuidadosamente as peças e levei-as para sala onde montei a arma conhecida por todos como RAIO DA MORTE. Bufando de raiva, apertei o botão loading, abri a porta, atravessei o portão com meu querido brinquedo nas mãos e me dirigi à porta ao lado. Estava aberta. É incrível como esse povo primitivo ama a idéia de que todo mundo gosta ou é obrigado a agüentar as merdas que eles ouvem, arreganham suas portas e ficam em seus sofás, as cervejas e o tira-gosto no chão da sala e o som truando, pra aquele que passa ver o decadente espetáculo da degradação humana. Pois foi nessa cena que a destruição de verdade começou. O corpo batráquio do meu vizinho esparramado em sua poltrona exaltou-se ao perceber a arma em minhas mãos. Entrei como Schwarzeneger em Exterminador do Futuro 2 quando eles invadem a sede da Cyberdine. Os olhos arregalados pediam misericórdia. Mirei sem problemas no aparelho de som dele e disparei. As peças voaram na explosão. Sua voz anasalada, bem característica dos papudinhos da rua gritava: “Não!Não!Não”. Parado diante de sua deprimente figura, com um sorriso no canto da boca só consegui pensar em uma frase, tal minha inspiração naquele momento: “Hasta La vista...baby”. O disparo em sua direção, o clarão do raio, a sombra de seus ossos se desintegrando no ar e a mancha de pó no chão. Deleite. Puro, simples, verdadeiro deleite.

De dentro da casa, ouvi a voz esganiçada da mulher dele. Parecendo uma gralha gripada ela vinha com duas garrafas de cerveja na mão falando aos gritos (pessoas adeptas desse estilo de vida não só não têm noção do volume da música que ouvem como também não conseguem controlar a intensidade do som de suas próprias vozes e falam alto EM TODA E QUALQUER SITUAÇÃO): “Amoziiiiiiiiiim! O CD pirata arranhou de novo, foi?!”. Quando viu os resquícios do aparelho de som ainda soltando faíscas na estante e o monte de pó inútil que segundos atrás era um monte de carne inútil, largou no chão as garrafas e soltou um grito estridente que machucou profundamente meus tímpanos e me deixou momentaneamente desorientado ao que perdi a mira do meu segundo tiro e abri um gigantesco buraco em sua parede.
Ela tentou escapar correndo para dentro da casa. Fui em sua perseguição. Atravessei o corredor, sempre mantendo minha calma schwarzenegeriana olhando cuidadosamente cada cômodo. Como era previsto, encontrei minha caça em seu quarto. Tentou se esconder debaixo da cama...mas ficou entalada de tão gorda que era. Disparei o raio da morte na cama que ficou destruída, explodindo em pedaços. A mulher implorava por piedade, mas era impossível. A raiva que eu sentia por ter sido torturado tanto tempo tinha de ser executada e aquela era a minha chance de fazê-lo com estilo. Ela se debatia num pranto histérico. Fiz sinal de silêncio com o indicador nos lábios: “Psit!”, ao que ela paralisou-se imediatamente. “O sol é para todos”, eu disse com uma voz serena a La Clint Eastwood, “mas hoje, ele é só meu...” e desintegrei meu alvo com uma rajada de máxima energia do meu raio da morte deixando uma colossal mancha escura no chão.
Quando saí da casa, na rua havia dezenas de pessoas que se aglomeravam para ver o que estava acontecendo. Quando perceberam a arma em minha mão tiveram noção do perigo que corriam. “De hoje em diante”, bradei aos curiosos, “este será um lugar de paz e silêncio! Um lugar onde o cidadão poderá dormir sossegado aos domingos, ler durante a semana, assistir tranquilamente seus filmes preferidos sem ser importunado pelo som nauseabundo desse lixo que vocês chamam de música! Aquele que desobedecer minhas ordens terá sua ignóbil existência obliterada deste universo!”
Caminhei até minha casa, fechei a porta. Desmontei minha arma libertadora, minha Matriz da Liderança. Minha esposa ainda ressonava cândida no leito (como é que ela faz isso, meu Deus!) quando fechei a maleta e coloquei no lugar. Calmamente voltei à minha mesa, tomei o livro e li os trechos mais bonitos.
De repente, eu acordei, então no mundo real e não naquele sonho lindo que acabara de ter. O som ensurdecedor dos vizinhos malditos me acordou de novo. Caminho até a sala e vejo o Superman balançando de um lado para o outro. Alípio Martins canta “Lá Vai Ele Com a cabeça Enfeitada”. Triste realidade onde um homem acuado pela repressão cultural não pode comprar um canhão desestabilizador atômico no mercado negro...

segunda-feira, 22 de março de 2010

OS OUTROS


No blog Rapadura Açucarada, que é o meu favorito de toda a net, o Eudes, dono do mesmo, publicou o comentário de um certo Nehemias que eu achei interessante e resolvi também publicar aqui. Achei legal, pois apesar dele falar algumas coisinhas de uma forma meio radical demais, a maior parte do que está lá é muito do que tenho pensado nos últimos dias. E acho que minha priminha Renata vai reconhecer nossas conversas no discurso do rapaz.rsrsrs.
Lai-se vai,negada:

A REVOLUÇÃO QUEM FAZ É CADA UM
Um texto de Nehemias, O Farrista





"O Fantástico era fantástico quando eu tinha 11 anos de idade. Aí eu cresci e a idade mental também. O Fantástico é o ápice do superficial. Nada pode ser mais raso do que isso. Querem fazer um programa que atinge todo mundo. É a mesma coisa que uma pessoa, sem personalidade, que tenta agradar a todo mundo e nunca dá uma opinião incisiva."
Eu digo: concordo plenamente com o companheiro Nehemias. Só acho que ás vezes é interessante a gente notar que existe o botão "desliga" na tv.
"Quem acredita na Globo está em maus lençóis. No Brasil, é o veículo de comunicação encarregado de cometer o crime de criar um mundo de ilusão, em que só pessoas de cabelo liso e com a roupa que aparece nas novelas, podem ser felizes. Conheço gente que segue tudo que mostra nas novelas, desde linguagem, até penteados, nome do cachorro, gírias, tudo. E é muito triste."
Eu digo: triste verdade, brother..."Big Brother eu nem sei o que dizer. Observar o comportamento das pessoas até que não é de todo ruim. Agora, precisa ver que tipo de gente colocam lá. Por que os que apareceram em todas edições, pareciam muito com o Fantástico. Ou seja, fantasticamente superficiais. E se isso acontece, é porque, infelizmente, a audiência é superficial. E dá pra constatar isso porque a intenção dos produtores de qualquer programa é fazer com que a audiência se identifique com os participantes/personagens. Então, se você se identificou com Bam Bam, Domini, Dourado ou alguma devassa que está ou esteve lá, o problema é bem pior do que imagina."
Eu digo: é verdade, meu velho. Só acho meio perigoso quando a gente tenta classificar "o tipo de gente" ao qual as pessoas pertencem.
"A educação nunca vai poder competir com o entretenimento. Não adianta sonhar que todo mundo vai querer ver TV Escola, Globo Ecologia o dia todo ou Canal Futura. Isso não vai acontecer. Mas a Globo faz questão de apodrecer ainda mais o cérebro das pessoas. Pessoas essas que não tem tempo pra nada por trabalharem muito, o dia todo. E aí, quando chegam em casa precisam se contentar com um mundo de ilusão, um padrão de comportamento inexistente, um modo de vida que não existe e que nunca vai existir, porque só existe atrás das câmeras. Esse padrão de comportamento inexistente é alvo de muita gente. E é ridículo. O "ter" passa por cima do "ser" e ninguém diz nada. A mentalidade ocidental ajuda muito a estragar também. Mas os grandes como a Globo não esboçam qualquer tentativa de dizer algo que transforme mesmo a vida de alguém. Não existe revolução nenhuma. O que existe são pessoas, domingo a tarde, assistindo o Faustão entrevistar personagens das novelas deles mesmos, em uma propaganda institucional que vai além da cara-de-pau de qualquer mau caráter.
Pregam a cultura do medo em seus jornais, para que todo mundo fique acuado e sem ânimo para fazer alguma revolução. Afinal de contas, não vale a pena o esforço porque "a violência está muito grande", "a economia está em crise", "a Palestina e Israel estão em guerra", "várias pessoas morreram em acidente de carro nesse fim de semana", "tiroteiro na favela entre policiais e traficantes", "cuidado com o que você come na rua", "cuidado com a Gripe Suína", "cuidado com Gripe Aviária", "cuidado com os tubarões", "cuidado com os PittBulls", "terremoto mata 100 mil", "tsunami mata 260 mil", "sequestro", "assassinato", "cuidado com o novo golpe", "cuidado", "cuidado". E com todo esse cuidado, todo mundo já passou do cuidado para a paranóia coletiva. Acabou. As manchetes dos jornais são sempre essas. Deixe de assistir durante uma semana e comece a se desprender do medo que quer te dominar e impedir que um dia você fale o que pensa sobre tudo.
Em um mundo individualista, agora a revolução e a transformação também é individual. Pelo menos, o início."
Eu digo: nisso, meu querido Nehemias foi soberbo.
Acabei há poucos dias de ler o livro 1984, de George Orwell, que tem tudo a ver com isso. Passei pra Renata e ela pegou a idéia e acho legal a discussão.


quinta-feira, 18 de março de 2010

CAMPANHA PRÓ-SOFIA COPPOLA


Na noite do Oscar eu estava teclando com minha querida amiga Dili, uma das pessoas com quem eu mais gosto de conversar, principalmente sobre cinema. Porém, durante a conversa, tivemos um pequeno desentendimento. Ela revelou que não gosta do filme Encontros e Desencontros, da diretora Sofia Coppola! se você conhece o filme e conhece a diretora sabe que é impossível uma pessoa tão sensível e de gosto tão refinado como a Dili não gostar desse filme.

Ela ainda teve a coragem de frescar com o nariz da Sofia, o que foi pra mim a gota d'água. Então comecei uma campanha, na verdade um protesto. Greve de fome até a Dili rever o filme, começar a amá-lo e, de quebra, pedir desculpas por ter falado do nariz mais charmoso de Hollywood. Ela achava que não, mas estou levando a sério meu protesto.
Eis uma foto da sofia e seu belo nariz...


E eis a minha última foto tirada durante uma madrugada cansativa de trabalho...


rsrsrsrs...

Então, vamos lá, Dili, vamos rever os conceitos. Nunca é tarde para mudar de opinião.

quarta-feira, 17 de março de 2010

INVOLUTION- FINAL PART (DOOMSDAY IS SOON COMING)



Sábado bonito. O calor nem incomoda muito. Minha esposa e eu vamos na casa da minha tia buscar um guarda-roupa que compramos (nosso primeiro desde que casamos).
Chegando lá, minha tia comenta que uma pessoa conhecida nossa faleceu há pouco menos de três horas. Na verdade a moça nem era tão próxima, mas ficamos tocados porque sabemos que ela é mãe de nossa vizinha. Ela morava na rua paralela a que moramos. O sábado ficou muito triste para nós.
A noite demos uma saída. Na volta passamos na rua ond a moça morava e percebemos que numa casa vizinha a dela estava acontecendo uma enorme festa regada àqueles terríveis forrós.
“Abdicar da nossa festa só porque alguém morreu?! Nós estamos vivos! E temos o DIREITO de fazer festa na hora que a gente quiser! Ninguém paga nossas contas!”

Coisas desse tipo me fazem pensar que só porque as pessoas raciocinam não significa que TODAS devam de fato serem consideradas seres humanos. Se você acha esse comentário muito radical, peço desculpas, mas o mais leve que pensei em fazer no lugar desse é algo no mesmo estilo das últimas falas do filme Diário dos Mortos de George Romero...





FIM DAS LAMENTAÇÕES...



domingo, 14 de março de 2010

INVOLUTION- PART TWO

Cinco e meia da manhã. Pulo da cama atordoado com o despertador. Rapidamente tomo banho, me arrumo, coloco na bolsa o material necessário para as habituais quatro aulas que leciono todas as manhãs. Beijo minha esposa que ainda dorme. Saio pelas ruas desertas até o ponto de ônibus observando as cores do céu e os desenhos das nuvens, os olhos bem pequenos ainda enxergam os sonhos.
Vários minutos esperando. “Porra de ônibus demorado do caramba...”
Lá vem o Cuca Barra. Lotado. Equilíbrio, destreza. “Desculpe, pisei no seu pé sem querer”.
O rádio toca alto. “Biurefú gueeel!?”. O motorista não imagina que nem todo mundo gosta de forró . Abro minha bolsa, puxo o mp4 e ponho Jimi Hendrix. “Eu não vivo hoje. Que vergonha desperdiçar seu tempo assim...”


Chego ao colégio. Aula de Biologia. Enquanto escrevo coisas no quadro as meninas só falam de Big Brother. Os meninos só falam de futebol. Por mais que alguns segundos persiste em mim a idéia (certamente equivocada) de que suas vidas se resumem a esse papinho vazio.
Onze e meia. Estou de novo dormindo de pé na parada de ônibus. “Porra de ônibus demorado do caramba...”
O Sol assassino incendeia minhas esperanças. No ônibus uma voz imbecil tenta encaixar versos tão vazios quanto a conversa dos alunos numa melodia pobre. “Mão na cabeça que vai começaaaaar...”
Puxo o mp4. Bob Dylan. “ Melhor começar a nadar ou você afundará feito uma pedra...”


Lembro que as mudanças são lentas e tento me concentrar na seguinte verdade: o mundo precisa ser assim. O mundo é perfeito do jeito que está.
Gostaria de acreditar nisso, pois não acredito mesmo sabendo que é verdade.
O mundo é (quase) perfeito do jeito que é. Só queria que as pessoas morressem menos.

quarta-feira, 10 de março de 2010

INVOLUTION-PART ONE



Há poucos dias estava na biblioteca com uma pessoa próxima. Ela é uma garota de dezessete anos, eu a estava ajudando com um trabalho de física numa tarde de domingo. Em um dos livros achei uma célebre foto em que Einstein bem jovem aparecia ao lado de outros grandes cientistas. Eu apontei para a figura do físico e perguntei à garota: “Sabe quem é esse aqui?”. Ela riu e com um olhar confuso respondeu: “Não. Quem é?”. “Olha melhor”, insisti. Não vi efeito. Então revelei: “É o Einstein!”. Ela riu mais forte como se estivesse sendo vítima de uma brincadeira: ”Quem é Einstein?”.
Ela estava rindo, mas era sério.

Bem, isso é loucura, mas de repente me senti muito solitário mesmo. Senti-me velho e ranzinza, sei lá.
A terra está mesmo se abrindo em muitos lugares e isso faz mais sentido pra mim do que viver num mundo onde as pessoas não conhecem Einstein. Acho que esse é o período mais Body Snatchers que vivo. A TV está maluca, cheia do duplipensar orwelliano e as pessoas não se entendem e não querem se entender. Sinceramente eu não acho exagero nenhum pensar assim. Tá tudo muito foda...

sábado, 6 de março de 2010

SICKO-SOS SAÚDE



SICKO, filme do polêmico documentarista americano Michael Moore, é uma crítica contundente e bem elaborada à realidade do serviço de saúde estadunidense. De maneira irreverente e beirando o humor negro, o sarcástico diretor nos conduz por um caminho através do qual podemos observar exemplos dentre as 250 milhões de pessoas que sofrem com as altas taxas dos planos de saúde que vampirizam seus orçamentos sendo essa a única alternativa para aqueles que podem arcar com esses custos pelo mínimo em atenção a saúde.Tratamentos quimioterápicos negados a pacientes com diagnósticos graves de câncer. Cirurgias urgentes descritas como procedimentos “desnecessários” ou experimentais. Contratos negados a pessoas obesas ou magras demais sob a alegação de terem potenciais doenças crônicas de alto custo. É a esse tipo de serviço de saúde que os americanos têm de se submeter. Nos Estados Unidos não existe um sistema unificado e universal de saúde. Praticamente todo o sistema é controlado pelas mega-empresas de seguros de saúde. Por meio de artimanhas políticas e malabarismos jurídicos, ao longo do tempo essas empresas foram angariando poder e influência na sociedade americana, o que constitui um enorme contraste, tendo em vista que o país é uma das maiores potências econômicas do mundo possuindo inúmeros recursos característicos de países desenvolvidos como excelente sistema de correios, escola grátis para todas as crianças, polícia e bombeiros bem treinados. Moore questiona os motivos pelos quais não há um sistema de saúde socializado se tantos outros serviços o são.Ele se baseia nas evidências claras de manipulação dos grandes empresários desse grande e lucrativo mercado nas políticas sociais, prática que não é nova, mas que ainda é forte. Grande parte dos congressistas possui ligações com as seguradoras, o que se traduz em um contínuo esforço do Poder Legislativo em arquitetar estratégias legais que resultam nas facilidades de atuação das empresas e Moore nos mostra que isso tudo acontece de uma maneira não muito sutil.Hillary Clinton desde a década de noventa, quando era então Primeira-dama, foi militante a favor da criação de um sistema de saúde socializado. Hoje, pouco mais de uma década após sua incursão em campanhas e projetos que apoiavam essa causa, é uma das maiores beneficiadas pelos lucros de empresas de planos de saúde tendo abandonado seus ideais.Aliado a isso, as concepções arcaicas que caracterizam a mentalidade dos norte-americanos é alimentada com idéias anti-comunistas remanescente do pós-guerra, resquício anacrônico do macartismo, corrente reacionária anti-socialista que ascendeu com o início da Guerra Fria. A idéia de que uma saúde universal e igualitária é sinônimo de má qualidade é refutada por Moore quando este faz uma peregrinação por vários países como França, Inglaterra e Canadá e mostra que o grau de satisfação de clientes e profissionais revela o exato oposto.Colocar em cheque essas idéias proporcionou ao filme um dos momentos mais hilários e também emocionantes. O diretor reuniu um conjunto de pessoas que atuaram nos resgates às vítimas do 11 de Setembro e que, por exposição ao ambiente hostil da tragédia, hoje sofrem com problemas de saúde e vivem em pobreza e humilhação com doenças pulmonares,distúrbios psíquicos e outros tipos de invalidez sem a ajuda do governo à mercê dos planos de saúde. Levado pelas informações de que na prisão militar de Guantânamo os terroristas responsáveis pelos atentados recebem tratamento médico gratuito e de qualidade, Moore embarcou numa viagem clandestina à Cuba. Sendo mal recebidos pelas autoridades responsáveis pelo território americano em Guantânamo, decidiram passar por Havana e atestar que um país violentado pelo severo embargo econômico imposto pelos EUA, apesar de socialista e retrógrado, é capaz de prover o povo de um serviço médico moderno, bem estruturado, universal, gratuito e baseado em atenção primária.Fazendo uma análise e uma comparação da situação da saúde nos EUA com a nossa, podemos colocar algumas observações úteis às reflexões quanto ao que se deva pensar de um sistema de saúde eficiente. Conhecendo a forma como o governo americano encara a participação do Estado no contexto das necessidades de saúde do povo, pode-se considerar que nosso SUS deva ser concebido como um sistema teoricamente ideal, ou no mínimo de qualidade e princípios norteadores superiores aos daquela nação. Na prática, considerando o fato de que há em nosso país na verdade um regime híbrido entre o privatista e o estatal, percebe-se facilmente que a influência do primeiro marca importante presença no que diz respeito às facilidades que um sistema unificado oferece. Haja visto o sucateamento das unidades e o pouco e deficiente repasse das verbas estipuladas do Governo Federal aos municípios devido à burocracia, maus planejamentos e aos desvios. Tudo isso favorece, aqui no Brasil, o crescimento de grupos semelhantes àqueles que detêm o “mercado da saúde” em solo americano provocando uma situação que não difere muito da que passam as pessoas daquele país: quem tem dinheiro tem direito à saúde, quem não tem espera por milagres.É certo que o SUS nos trouxe inúmeros avanços sociais desde sua criação, bem percebidos quando se avalia comparativamente os indicadores de saúde de hoje com os de épocas em que o sistema não existia. Porém, SICKO pode nos levar ainda a uma outra reflexão: como um país em crescimento e com tantas riquezas como o Brasil não é capaz de fazer um sistema de saúde tecnicamente bem elaborado a desenvolver todo seu potencial?