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Art by Ben Zank |
Jorge
não sabia se estava vivo ou morto.
Só
conseguia se ver num deserto e seus dois pés sobre uma faixa branca que vinha
do infinito para trás e terminava no infinito para frente. De um lado da faixa,
a dois passos, um prato de arroz. Do outro, a mais dois passos, um prato de
feijão. Logo entendeu que cada alimento era um símbolo. Uma representação da
vida e da morte.
Então
lhe veio a ideia de que talvez aquele fosse o momento decisivo. Talvez tivesse
sofrido algum acidente, ido parar num desafio etéreo e deveria optar. O que vai
alimentar seu espírito a partir de agora?
Não
fazia a mínima ideia. O tempo passava, seus pés amedrontados continuavam
colados à faixa branca que os continha e os dois pratos esperavam a atitude
definitiva.
Arroz
é vida e feijão é morte? Ou o contrário?
Poderia
passar a eternidade ali, mas daria na mesma. Por isso decidiu fazer o que não
fizera durante toda sua existência: arriscar. E prometeu para si mesmo que se
sua escolha representasse vida, passaria o resto dela envolvido com coisas que
o satisfizessem tão plenamente que na próxima vez seu espírito não precisaria
mais estar ali, envolvido com o solitário veredito, tomado de tormento com a
certeza de que a missão não está ainda cumprida.
Fechou
os olhos e sentiu um fino prazer outrora recusado veementemente. O prazer da
dúvida.
Deu
um salto e deliciou-se com uma maravilhosa poção... de arroz.
Este texto é resultado do exercício
proposto por P.J. Brandão no último dia da oficina de storytelling do Vila das Artes. Crescimento verdadeiro e
parte do “fino prazer”. O exercício consistia em criar uma pequena história em
minutos, citando palavras escolhidas por livre associação e agrupadas aleatoriamente.
As palavras que tive de usar foram: morte, arroz, feijão, etéreo.