segunda-feira, 22 de abril de 2013

ENGRENAGENS

Metropolis, Fritz Lang

O trabalho dignifica o homem.
Eis um aforismo dos mais verdadeiros. Antes de ter um trabalho de verdade eu encarava essa máxima como o lema de homens fortes, com grossas botas e luvas carregando sacos para dentro e para fora de navios num porto, ou daqueles que operam com precisão braços gigantes balançando vigas de metal nas construções. Homens que erguem cidades com a força dos músculos e voltam para casa com sua missão cumprida.
Para eles a vida é difícil, mas a sensação de estarem impressos nas armações sobre as quais os donos do controle esquematizam o destino da Civilização já é grande recompensa. Eles chegam em casa cansados e com fome. Irão se refestelar com uma montanha de comida em seus pratos e descansar.  Era uma imagem “romantizada” do que significava trabalho para mim.
Mais tarde, a alucinada histeria de Chaplin apertando porcas na ânsia de vencer a máquina manchou esse romantismo.
Acabei adquirindo pelo menos o mínimo de pensamento crítico a ponto de questionar tudo o que compõe a realidade ao meu redor. Embora meu apuro nesse sentido sofra muito com minha tendência particular a dar o fora dessa realidade por períodos inconstantes, permaneço no mundo objetivo tempo o bastante para precisar seguir algumas... regras...que ele impõe.
Trabalhar é uma delas. Para ganhadores do Big Brother, loterias, heranças trilhardárias e para o tio do Chris (aquele que come o angu com queijo do Julius), essa regrinha não entra na cartilha. Para o resto de nós ela vem logo depois da Lei da Gravidade.
Minha relação com o trabalho acabou me fazendo separar os diversos tipos de emprego em duas categorias: os trabalhos de verdade e os trabalhos legais. Como força física nunca foi um dos meus atributos pessoais, fui forçado pela minha condição a aceitar que quando chegasse a hora precisaria encontrar um trabalho de legal. Mas parte do meu mundo tinha como referência de pensamento uma figura paterna machista e reacionária que deixaria Kafka com as calças sujas, e isso me fez sentir um pouco diminuído. “Trabalho de verdade é pra homem”, dizia o subtexto de seu discurso, “você é homem ou não?!”
Juro que se foi uma afronta, ela foi fruto total do subconsciente, mas para a raiva do sujeito acima citado, acabei me formando em Enfermagem. Ha ha ha.
O trabalho legal é aquele em que o tempo passa e você não percebe que está trabalhando. Ele é parte de você como seus braços e pernas. A minha ideia é a de que todo mundo que tem um trabalho de verdade, dentro de si tem um trabalho legal com o qual sempre sonhou.  Eu tenho o meu. Não vou dizer qual é, mas ele inclui poder levantar do meu lugarzinho e brincar uns cinco minutinhos com minha filha, ou dar um beijo em minha esposa sempre que tiver vontade.
Outra coisa que penso é que todo emprego considerado trabalho de verdade para alguém é o considerado trabalho legal por outra pessoa. Se for assim, o que faz uma pessoa ficar por anos fazendo algo que não gosta, ou que não é o que sempre quis? Por que essa pessoa não foi na direção que levava ao seu objetivo principal? Cada um tem a sua resposta. Só posso dar a minha: é porque ninguém prepara a gente para se descobrir. Somos “educados” em grande parte para obedecer sem questionar, seguir caminhos instituídos, aparentemente mais seguros, garantia de sucesso. Até o momento em que um Chaplin entra em nossa vida, muita coisa já está definida. Muitas vezes é difícil ou tarde demais (será?) para voltar atrás.
Graças a Deus, o meu trabalho legal é algo que eu posso fazer de madrugada, de manhã antes do trabalho de verdade e no meio do trabalho quando meus chefes não estão (como agora e em um post anterior, por exemplo), embora nem sempre eu possa ver minhas mulheres.
Mas se eu tivesse moral para dar conselhos, daria apenas um. Essa é a mensagem que eu quero deixar para a posteridade e espalhá-la para o máximo de pessoas possível: NÃO TOME ATALHOS. Isso mesmo. Descubra o seu caminho e vá direto para ele. Faça o que for necessário, mas nunca dê um passo que lhe ponha distante de seu objetivo. Não importa o que digam. Vão dizer que você não vai conseguir, que é difícil, que não vai dar dinheiro. Ignore isso. Continue.
No final das contas, não importa se seu trabalho legal é se ver numa construção, numa neurocirurgia ou escrevendo um romance. De muitas formas diferentes, o suor deve escorrer pela testa do mesmo jeito. Se não for assim não vale a pena.
E tem que ter seu coração ali.


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