quarta-feira, 30 de outubro de 2013

O MOMENTO DO PORTAL

Art by Juliana Lopes


Tudo o que se diz com mais certeza ainda é parte da grande interrogação. A certeza é mais eufórica quando um vento quente, um facho de luz ou um eco do impossível é ouvido. E aquilo nos parece resposta.
Sim, alegramo-nos com pequenas verdades, já que todo o resto parece encenação. A carne é fraca, mas a vontade é aço. E a pressa em chegar é o atalho do sumiço.
Ontem conversei com um dragão. Ele me falou sobre as vantagens do fogo. O calor de suas palavras me envolveu. Quis ser dragão.
Em sonho eu andava pelas cordilheiras de um país gelado. Dei-me com um castelo, uma sacerdotisa e um príncipe das neves. Disseram que o frio nos faz jovens para sempre. Acordei tocando todas as coisas com mágicos dedos roxos.
Os senhores da noite também vieram. O exército da destruição marchou na calçada. Também uma revoada de anjos que entoou a Boa Nova sobre o telhado e uma quimera que rosnou em meu ouvido. Todos eles transformam pensamentos em diamantes, mas nenhum trouxe a resposta para a questão primordial: o que sou eu?
Quanto mais eu vivo, quanto mais tropeço, mais percebo que é a única pergunta a ser respondida.
Os dias são marcados pela visita perspicaz dos gênios e demônios que adentram a morada da esperança. E os demônios vêm por portas semiabertas. Não os deixemos partir impunes. Querem roubar de nós o que é bom. Roubemos deles o momento do portal. Do mesmo jeito que entram sem bater, devemos aprender a sair sem avisar.
Eles querem nossa prisão. Que acreditemos nessa euforia de um final ilusório. Não se pode culpa-los. Enganar-nos é seu trabalho. O nosso é resistir.



Nenhum comentário :